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Resist锚ncia pigmentada: conhe莽a hist贸rias de supera莽茫o de servidoras do IFS

Escrito por GERALDO BULHOES BITTENCOURT FILHO | Criado: Segunda, 20 de Novembro de 2017, 08h42 | Publicado: Segunda, 20 de Novembro de 2017, 08h42

Observem os dados: pesquisa do Instituto Ethos mostra que somente 4,7% dos cargos executivos s茫o ocupados por negros. Entre funcion谩rios de n铆vel hier谩rquico superior apenas aos estagi谩rios, os brancos atingem 62,8% e os negros, 35,7%. J谩 72,2% dos cargos de ger锚ncia s茫o preenchidos por pessoas de pele clara, contra 25,9% de afrodescendentes. Um estudo do Ipea tamb茅m 茅 revelador: no servi莽o p煤blico, a presen莽a do negro 茅 reduzida em carreiras mais valorizadas. Na Diplomacia, eles representam 5,9% do total; na Auditoria da Receita Federal, a rela莽茫o 茅 de 12,3% e 87,7% a favor dos brancos. As estat铆sticas apresentadas at茅 aqui fariam sentido se retratassem a realidade de pa铆ses n贸rdicos ou asi谩ticos, cujas popula莽玫es s茫o compostas, na maioria, por brancos. Entretanto, as duas pesquisas foram aplicadas em um territ贸rio habitado por 113 milh玫es de afrodescendentes, quase 54% do total. A discrep芒ncia demostra que alcan莽ar objetivos pessoais de vida 茅 uma tarefa ainda mais 谩rdua para o negro 鈥� e, claro, que devemos valorizar 脿s pessoas que, mesmo diante dos in煤meros obst谩culos, mostram que cor de pele n茫o 茅 fator determinante para atribuir compet锚ncia e profissionalismo. 

O abismo de oportunidades que separa brancos e negros n茫o foi suficiente para enfraquecer Irin茅ia Rosa do Nascimento na busca dos seus sonhos. Hoje, ela 茅 professora efetiva do Instituto Federal de Sergipe (IFS) com doutorado na 谩rea de zootecnia e ocupa o cargo de diretora de ensino no Campus S茫o Crist贸v茫o. Irin茅ia ressalta, por茅m, que a jornada passa longe de ser f谩cil e aponta diversas situa莽玫es em que, de forma recorrente, v锚-se submetida somente pela cor da pele. 鈥淓m bancos, j谩 fui impedida de entrar antes de abrir a minha bolsa; em lojas, sutilmente sou vigiada. Em in煤meras situa莽玫es noto o desd茅m de indiv铆duos que gostariam de dizer que ali n茫o 茅 meu lugar鈥�. Nessas ocasi玫es, a docente encontrou um recurso para se impor: 鈥渆ncaro firmemente essas pessoas e, de forma educada, indago se tem algo errado. O pior 茅 que elas se acovardam e n茫o dizem o que est茫o pensando鈥�. Diante das experi锚ncias de vida que acumula e das vit贸rias que alcan莽ou, Irin茅ia v锚-se como exemplo para seus alunos. 鈥淓ssa 茅 uma das motiva莽玫es para exercer o cargo que agora ocupo. Digo para eles que n茫o devemos acreditar em quem nos diz que n茫o somos capazes. Estudar e persistir t锚m suas recompensas, sim. A educa莽茫o revoluciona鈥�, ressalta.

Quem indica?

Um dos fatores que ajudam profissionais a se colocarem no mercado ou de preencherem as vagas de chefia 茅 o capital social que elas possuem, ou seja, a rede de contatos que constroem ao longo da vida que facilita o acesso ao topo. Esse circuito de oportunidades acontece, por exemplo, quando um ex-colega de universidade indica um amigo para disputar uma boa chance na empresa que atua ou um tio que conhece a forma莽茫o do sobrinho e o referencia para um emprego em uma multinacional. Nesse quesito, a pesquisa publicada pelo Ipea tamb茅m d谩 boas pistas sobre a poss铆vel raiz do problema: os negros representam tr锚s quartos da popula莽茫o menos abastada. Isto 茅, em cada quatro pobres, tr锚s s茫o negros. A falta de um networking influente, de modo geral, deixa mais uma vez o afrodescendente em desvantagem. Para o professor de sociologia do Campus Itabaiana, Vin铆cius Rodrigues Alves, os contatos que se estabelecem ao longo da trajet贸ria de um indiv铆duo s茫o usados como condi莽茫o de acesso, situa莽茫o que contribui para que a sociedade privilegie os que j谩 se encontram no topo da hierarquia social. 鈥淣ota-se de forma bastante evidente que a nossa forma莽茫o hist贸rico-pol铆tica 茅 marcada pelo que muitos chamam de pessoaliza莽茫o administrativa, ou seja, se voc锚 se encontra inserido em uma rede de alto valor de capital social, voc锚 se insere, do contr谩rio, o que notamos 茅 a exclus茫o鈥�, aponta Vin铆cius.

Trajet贸ria de vida sem privil茅gios tamb茅m possui a diretora geral de bibliotecas do IFS, Kelly Cristina Barbosa. Paulista de origem humilde, come莽ou a trabalhar aos 14 anos em uma universidade que a empregou at茅 os 29 anos. 鈥淔oram tempos muito dif铆ceis, por茅m de grandes e preciosos aprendizados鈥�, relembra. A tarefa de conciliar trabalho, estudo e fam铆lia foi 谩rdua, mas lhe deram bagagem para al莽ar voos maiores. Hoje, 脿 frente de um dos setores que mais se profissionalizou no IFS, Kelly se orgulha das dificuldades que deixou para tr谩s e lamenta que, mesmo no s茅culo XXI, cor de pele represente obst谩culos. 鈥淪abemos que no mundo inteiro o negro 茅 tratado como cidad茫o de segunda ou terceira classe. Isso 茅 vis铆vel na forma de remunera莽茫o, nos papeis secund谩rios que os artistas negros assumem na televis茫o e no cinema, nas chances de emprego e no acesso 脿 educa莽茫o鈥�, explica. A resposta que Kelly deu diante das barreiras que a vida colocou foi estudo e trabalho. 鈥淎cho que n贸s, negros, atrav茅s de muito sofrimento, j谩 conseguimos vencer batalhas e conquistar espa莽o na sociedade, afinal somos iguais, independentemente de cor e classe social鈥�, diz. Mesmo reconhecendo os avan莽os, Kelly n茫o se furta de engrossar o coro com a frase que os movimentos sociais em todo o mundo buscam dizer ao m谩ximo de pessoas: 鈥淎inda h谩 muita luta pela frente鈥�.

Mat茅ria originalmente publicada na edi莽茫o de novembro do jornal A PR脡VIA